STJ - Atraso na entrega de imóvel do Programa Minha Casa, Minha Vida gera dano moral.
REsp nº 1.818.391 – RN
EMENTA: RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. PROGRAMA "MINHA CASA, MINHA VIDA". LONGO ATRASO NA CONCLUSÃO DA OBRA. PRORROGAÇÃO DO PRAZO MEDIANTE ACORDO HOMOLOGADO JUDICIALMENTE. DESCUMPRIMENTO DO ACORDO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CABIMENTO NA ESPÉCIE. 1. Controvérsia acerca das consequências do atraso na entrega de um imóvel financiado pelo programa Minha Casa, Minha Vida - PMCMV, com subvenção econômica estatal. 2. Cabimento de indenização por danos morais em virtude do longo atraso na entrega do imóvel (mais de doze meses após o período de tolerância) por se tratar de imóvel adquirido por família de baixa renda no âmbito do "Programa Minha Casa, Minha Vida", com auxílio estatal por meio de subvenção econômica. Julgado anterior desta TURMA. 3. Existência de acordo, homologado judicialmente, mediante o qual se prorrogou o prazo de entrega do imóvel para além do período contratual de tolerância. 4. Descumprimento do acordo pelas demandadas, não tendo sido concluída a obra no novo prazo pactuado. 5. Circunstância agravante da culpa das demandadas, intensificando o abalo psíquico sofrido pelos adquirentes. 6. Cabimento da indenização por danos morais na espécie. 7. Restabelecimento dos comandos da sentença, em que a indenização fora arbitrada em R$ 10.000,00 (dez mil reais), valor que se mostra adequado aos parâmetros de razoabilidade adotados por esta Corte Superior em casos semelhantes. 8. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (negritei)
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A controvérsia enfrentada pelo STJ no recurso em comento diz respeito ao cabimento de indenização por danos morais em virtude de atraso na entrega de imóvel adquirido por meio do "Programa Minha Casa, Minha Vida" - PMCMV.
O contrato, no caso concreto, foi celebrado em 2014 e previa a entrega das unidades imobiliárias em 2016. O prazo não foi cumprido.
No curso do ano de 2016, a construtora/incorporadora, a Caixa Econômica Federal (CEF) e os adquirentes firmaram acordo para a entrega das unidades em março de 2017, que foi homologado judicialmente. Esse acordo também foi descumprido.
O Ministro Relator ressaltou que a atual jurisprudência do STJ se orienta no sentido de que o atraso na entrega do imóvel é mero dissabor da vida na sociedade de consumo, de modo que esse fato, por si só, não é apto a ensejar indenização por danos morais.
Contudo, entendeu por necessário distinguir a situação das famílias de baixa renda para as quais a aquisição da casa própria tem um significado muito mais expressivo do ponto de vista da realização pessoal em relação à situação das pessoas mais abastadas, que têm a seu alcance diversas outras formas de realização pessoal.
O direito à moradia ganhou status constitucional a partir da Emenda Constitucional nº 26/2000, passando a ser elencado no art. 6º, caput, integrando assim o rol dos direitos fundamentais previstos na Constituição.
Nesse contexto normativo, o Programa Minha Casa, Minha Vida - PMCMV (instituído pela Medida Provisória 459/2009, convertida na Lei 11.977/2009) pretendeu dar concreção ao direito fundamental à moradia digna, ao criar mecanismos de incentivo à produção e aquisição de novas unidades habitacionais para famílias de baixa/média de renda.
A Lei 11.977/2009, ao instituir o programa, estabeleceu as suas linhas mestras, deixando aos regulamentos, principalmente aos editados pelo Ministério das Cidades, dispor acerca das normas específicas de operacionalização, inclusive as faixas de renda, faixas de valor dos imóveis, padrões construtivos e os critérios de seleção dos beneficiários.
A subvenção econômica somente é concedida para operações enquadradas nas faixas 1,5 e 2, observado o limite de R$ 3.600,00 de renda mensal bruta familiar.
Nessas duas faixas de renda, a previsão de uma subvenção econômica estatal já evidencia, por si só, a magnitude de importância da casa própria para o bem-estar dessas famílias.
Sob esse prisma, o STJ entendeu que, para essas famílias, o atraso por tempo significativo na entrega do imóvel (v.g., atraso maior do que doze meses após o período de tolerância) não significa apenas um inadimplemento contratual, mas a postergação (se não, frustração) de uma realização de vida, a qual, no mais das vezes, é a mais significativa, em termos patrimoniais e de bem-estar, a ser alcançadas por famílias de baixa renda.
Esse sentimento de frustração, ao juízo do Ministro Relator, produz abalo psíquico em intensidade superior ao abalo decorrente do mero inadimplemento contratual, dando ensejo à obrigação de indenizar os danos morais experimentados pelos adquirentes.