STJ – É válida cláusula que prevê a perda integral dos valores pagos em compromisso de compra e venda entre particulares.
REsp nº 1.723.690 - DF (2018/0030908-1)
EMENTA: RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL ENTRE PARTICULARES. RESCISÃO DO CONTRATO. VALORES PAGOS. PERDA INTEGRAL. PREVISÃO EM CLÁUSULA PENAL. VALIDADE. NEGÓCIO JURÍDICO. AUSÊNCIA DE VÍCIOS. PROPOSIÇÃO DO PROMITENTE COMPRADOR. ALEGAÇÃO DE INVALIDADE. IMPOSSIBILIDADE. PROIBIÇÃO DE COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Cinge-se a controvérsia a discutir a validade de cláusula penal que prevê a perda integral dos valores pagos em contrato de compromisso de compra e venda firmado entre particulares. 3. Para a caracterização do vício de lesão, exige-se a presença simultânea de elemento objetivo - a desproporção das prestações - e subjetivo - a inexperiência ou a premente necessidade, que devem ser aferidos no caso concreto. 4. Tratando-se de negócio jurídico bilateral celebrado de forma voluntária entre particulares, é imprescindível a comprovação dos elementos subjetivos, sendo inadmissível a presunção nesse sentido. 5. O mero interesse econômico em resguardar o patrimônio investido em determinado negócio jurídico não configura premente necessidade para o fim do art. 157 do Código Civil. 6. Na hipótese em apreço, a cláusula penal questionada foi proposta pelos próprios recorrentes, que não comprovaram a inexperiência ou premente necessidade, motivo pelo qual a pretensão de anulação configura comportamento contraditório, vedado pelo princípio da boa-fé objetiva. 7. Recurso especial não provido. (grifei)
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Cingiu-se a controvérsia a discutir a validade de cláusula penal que prevê a perda integral dos valores pagos no caso de compromisso de compra e venda de imóvel firmado entre particulares.
As partes celebraram um termo aditivo ao contrato de compromisso de compra e venda, para constar a cláusula cuja validade é objeto da presente demanda:
"3. CLÁUSULA TERCEIRA - RESCISÃO CONTRATUAL 3.1. A desistência do negócio ou o descumprimento da cláusula 1.1 do presente termo aditivo por parte dos PROMITENTES COMPRADORES/DOADORES ensejará na rescisão do Contrato de Promessa de Compra e Venda firmado em 18/2/2014, independentemente de qualquer notificação judicial ou extrajudicial, sendo incabível o ressarcimento aos PROMITENTES COMPRADORES/DOADORES dos valores dispendidos até a data limite para o cumprimento total de sua obrigação (5/5/2014), retidos pelos PROMITENTES VENDEDORES a título de perdas e danos" (grifou-se).
A hipótese dos autos não caracteriza os vícios de estado de perigo, tampouco de lesão.
No caso dos autos, por se tratar de compromisso de compra e venda celebrado de forma voluntária entre particulares que, em regra, estão em situação de paridade, é imprescindível que os elementos subjetivos da lesão sejam comprovados, não se admitindo a presunção de tais elementos. Entendimento em sentido contrário poderia incentivar a parte a assumir obrigações que sabe serem excessivas para depois pleitear a anulação do negócio jurídico.
Considerando, ainda, que o autor é advogado, com escritório estabelecido em Brasília nas áreas tributária e empresarial, não é possível concluir que se trata de pessoa inexperiente para a celebração de contrato de compromisso de compra e venda de bem imóvel.
Nas relações contratuais, deve-se manter a confiança e a lealdade, não podendo o contratante exercer um direito próprio contrariando um comportamento anterior. No caso, verifica-se que os próprios recorrentes deram causa a "excessiva desproporcionalidade" que alegam ter suportado com a validade da Cláusula 3.1 do termo aditivo.
Logo, concluir pela invalidade da Cláusula 3.1 do termo aditivo, ou mesmo pela redução da penalidade imposta, nos termos em que pretende o recorrente ao indicar a violação do art. 413 do Código Civil, implicaria ratificar a conduta da parte que não observou os preceitos da boa-fé em todas as fases do contrato, o que vai de encontro à máxima do venire contra factum proprium.
Ademais, é pacífica a jurisprudência do STJ no sentido de que o vício no negócio jurídico - no caso, a desproporcionalidade da cláusula penal - não pode ser invocado por quem lhe deu causa, sob pena de afronta ao princípio da boa-fé objetiva, consagrado no art. 422 do Código Civil de 2002.
Por fim, registrou-se que os precedentes citados pelos recorrentes, nos quais são considerados razoáveis percentuais de retenção entre 10% (dez por cento) e 25% (vinte e cinco por cento) do valor das prestações pagas, não se aplicam à hipótese vertente, pois tratam de relação de consumo em que o promitente vendedor é pessoa jurídica.
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